No princípio do mundo, só existia OLOFIN e o nada. Somente ele e sua altíssima vibração. Não existia nem tempo nem espaço. Então, ele decidiu pôr em marcha o tempo, originando inúmeras vibrações, suaves, para tecer o Universo. OLOFIN soprou mais forte e, a partir das partículas de seu hálito, se formaram as estrelas e os planetas. OLOFIN emitiu finos assobios dos quais surgiram as diferentes divindades. Ele determinou que as coisas estivessem separadas umas das outras: adiante, atrás, em cima e embaixo, originando o espaço. OLOFIN fez com que tudo tivesse um passado, um presente e um futuro.
Como OLOFIN se sentiu só, criou, de si mesmo, diversas entidades para distribuí-las no espaço. A partir de diferentes vibrações, surgiram diferentes divindades, cada uma com sua própria característica. OLOFIN criou primeiro OLODUMARÉ, para que este dominasse os espaços, e OLORUN para que fornecesse a energia. Em seguida, OLOFIN criou ODUDUWA, OBATALÁ e IFÁ, que seriam os benfeitores da futura humanidade, e deu, a cada um, uma tarefa a ser cumprida. Finalmente, com seu olhar, criou pequenas vibrações individualizadas e manteve a emanação vital permanente.
Tantas foram as criações e realizações, que nos escapam ao conhecimento, mas estão registradas em sua potente memória. Ele deixou estabelecidas as leis dos movimentos, deu cores às vibrações por sua ordem, originando a luz. Estabeleceu o equilíbrio entre as coisas, a comparação e a separação entre elas. Fez com que a lua competisse com o sol pelo domínio das influências no planeta. Depois de ter criado tudo, OLOFIN voltou ao repouso, para usufruir da contemplação da aventura universal.
IFÁ nasceu de OLOFIN para benefício da raça humana. Fez o inventário de tudo que havia sido criado para organizar na escala de valores. Nesta escala, IFÁ colocou OLOFIN no degrau vigésimo primeiro e OLODUMARÉ e OLORUN no degrau décimo sétimo. Ele próprio ficou, junto com OBATALÁ e ODUDUWA, no degrau décimo sexto, porém ODUDUWA ficou a frente, governando a trilogia.
Continuando com a ordenação, IFÄ colocou as divindades maiores no degrau décimo segundo e as menores no oitavo. Também, determinou que os espíritos dos homens divinizados estariam no degrau sétimo e os homens físicos no quinto degrau. Os animais e as plantas ficaram no quarto e, por último, os seres inanimados no terceiro degrau da escala de valores.
IFÁ estabeleceu, no intervalo entre um degrau e outro, sete níveis de diferenciação. Posicionou, então, exatamente no meio deste espaço, o homem comum com suas virtudes e defeitos. Acima, pôs o homem sábio, aquele que aplica sua inteligência em alguma atividade na qual se sobressai dos demais. Um pouco mais acima, colocou a dimensão do homem santo, que aperfeiçoou seu espírito e colecionou virtudes. Acima de tudo, ficou o santo sábio, que resume os melhores atributos que pode possuir um homem. Do homem comum para baixo, IFÁ posicionou o ignorante teimoso, que debocha do que desconhece; um pouco mais abaixo o homem malvado, que possui as piores qualidades e sentimentos da espécie humana e, por fim, o malvado sábio, que, querendo ou não, fez pacto com as entidades malévolas, aplicando sua sabedoria na destruição.
IFÁ instituiu que o comportamento do homem lhe permite ascender ou cair do lugar em que se encontra na escala, pois do meio para cima cresce a influência das entidades nobres e, para baixo, o contrário. Se a pessoa é iniciada e tem bom senso, analisa todas as virtudes e defeitos que existem e os localiza na escala de IFÁ.
O melhor representante de IFÁ na terra é ORUMILA pois ele se nutriu do espírito de IFÁ. Por inspiração divina, construiu o primeiro opelê, a partir do casco de uma tartaruga, e conheceu os ingredientes necessários e adequados e o modo de torná-los sagrados para que o ajudassem no trabalho.
IFÁ herdou de SHANGÔ o tabuleiro talhado na madeira da árvore sagrada. Aprendeu com OSSAIM o segredo das plantas. Recebeu de OGUM as armas do sacrifício. Teve em ELEWARA seu melhor mensageiro e amigo. Conheceu as qualidades das pedras do rio, da mata e do cerrado. Adorou as mulheres porque estas o cuidavam.
ORUMILÁ conheceu, através de IFÁ, os segredos da criação. Ele joga seu opelê para escrever, segundo o signo, o segredo que se revela, elaborando, assim, o livro sagrado. Por isso, diz ORUMILÁ, que tudo se pergunta a IFÁ, pois ele sempre tem uma resposta para cada pergunta.
Há muitos milênios, os homens esqueceram as verdades transcendentais, sem saber que elas ficaram escritas, por fragmentos, no livro sagrado de IFÁ e que ninguém possui esta obra completa, lamentavelmente perdida no tempo. Os iniciados de diferentes lugares têm partes desta grande obra do mestre ORUMILÁ, que chegou aos nossos dias por tradição oral e que devem ser explicadas nos vários signos do oráculo, ainda desconhecidos.
Quando OLOFIN criou, de si mesmo, o grupo de divindades, surgiram, numa última emanação, várias vibrações individualizadas. Tinham a mesma essência do ser que as criou e todas, como ele, conheciam os segredos do Universo. Todas partiram do não-tempo e do não-espaço; o tempo e o espaço não afetavam sua natureza, eram imortais desde o princípio. Afinal, quem pode impor limites ao ilimitado? Quem questiona do grande construtor a sua obra? Isto é assim tanto para as pequenas individualidades quanto para as grandes entidades, todas criadas no Universo com propósitos bem definidos.
Temos, então, o olhar de seres espirituais que interagem com os planos mais densos da criação, que são protagonistas de fatos transcendentes e que vivem sua experiência material na terra. Tudo isso ficou registrado no livro sagrado de IFÁ para que sempre, no futuro, se tivesse conhecimento do passado.
Isto dá um idéia, por exemplo, da grande diferença que existe entre o ser humano e a besta. Essa recebe como herança os instintos e traz ,em sua memória, fragmentos da vida de seus antepassados; possui instintos apurados para enfrentar a natureza, sendo a agilidade ou a força seus atributos principais e com a morte encerra o seu eu individual. Já no ser humano os instintos são mais débeis; esquece suas vidas passadas, a inteligência é o seu principal dote e, ao morrer, sua mente se soma ao infinito, onde o espírito recobra o conhecimento universal.
No princípio, os espíritos se expandiram pelo espaço, vagando sem um destino determinado; não tinham uma tarefa imediata para cumprir no programa cósmico. Foi OLODUMARÉ quem traçou um plano para que se reagrupassem perto da terra, sem ultrapassar a Lua, ficando nessa região do espaço. Foram, desta forma, testemunhas do trabalho dos construtores celestes, quando desceram as divindades maiores, em grupos de sete, cada grupo acompanhado de um séquito de entidades menores, distribuídas pelo planeta.
Os espíritos observaram as evoluções da esfera terrestre, onde se originou a natureza primitiva. Tudo isso ORUMILÁ, inspirado em IFÁ, deixou registrado nos diferentes signos do livro sagrado, para honra do grande benfeitor e de seu pai OLOFIN. Assim, por um tempo indefinido, vagaram estes espíritos sobre a terra, perguntando-se o que os mantinha ali, pois não possuíam os atributos necessários para efetuar qualquer mudança, nem a energia de suas vibrações afetava o que se denominava matéria. Isto porque a escala de IFÁ, também, determinou limites do poder, o que era nítido para toda a criação.
Ainda nos dias de hoje, os espíritos dos mortos vão para LIFÉ OORE, mundo dos mortos, onde recuperam seu conhecimento universal enriquecido com a experiência vivida. Quem visita, por um instante, esse lugar e retorna, em seguida, à vida terrestre, em geral, não encontra palavras para traduzir a grandeza do infinito.
De Lifé Oore descem os espíritos de luz a cumprir diversas missões na terra, e não devem ser confundidos com aqueles outros, escravos das entidades malévolas.
Olofin criou o universo no espaço e no tempo, e junto com ele as luzes que mantêm o equilíbrio, estabelecendo dois extremos: para a direita, se encontram as forças nobres, as que lutam pela harmonia; no lado oposto, estão as forças contrárias. Permitiu que as forças do bem inclinassem ligeiramente a seu favor a balança, sempre com o perigo de perder a vantagem, já que o mal rodeia o bem.
Ifá transmite ao homem sua sabedoria e lhe diz que, do degrau décimo segundo para baixo, todas as divindades e seres da criação podem ser influenciados por uma ou outra força, já que os mais nobres ou generosos têm suas poções e vinganças, e os muito malvados podem abrir o caminho da prosperidade.
Tudo depende do conhecimento que se tenha dos distintos caminhos e do livre arbítrio no cumprimento dos conselhos de Ifá.
Nunca devemos esquecer as recomendações que Orumilá costuma dar, para que as más influências não afetem nosso espírito com a desgraça. Porque ainda que tentemos nos esconder numa roupagem de santidade os maus pensamentos, o que ganhamos ou perdemos nos dá a realidade dos méritos adquiridos. Ainda que as entidades possam ajudar a prosperar, é importante tomar muito cuidado para que sua influência não absorva a pessoa por completo.
Por isto dizemos que, para resolver problemas nobres, trate Exu com respeito. Não faça pacto com as forças do mal para não cair em suas redes. Não imite os defeitos das entidades superiores, eles sofrem as calamidades da vida material, foram criados com propósitos diferentes e gozam da felicidade de seus planos celestiais. Se deixar crescer em você a maldade, corre o risco de, ao morrer, ter seu espírito afastado do conhecimento universal, convertendo-se em mais um instrumento das entidades malévolas.
Para criar a natureza mineral primitiva, desceram ao planeta, em grupos de sete, as divindades maiores misturadas com as entidades menores. Foram sete as vibrações fundamentais. Desceu Olokun para dar forma aos picos e aos oceanos, e Orishaoko para levantar as terras do fundo dos mares. Xangô criou a atmosfera e as nuvens com suas cargas elétricas. Ogum elaborou os minerais e esculpiu as montanhas. Yemanjá recortou as costas, atuando no equilíbrio terra-mar. Oxum deu lugar aos rios, aos mananciais e a todas as águas doces. Oroinha (Agayu) dominou os fogos centrais da esfera terrestre e manteve o controle dos vulcões.
Desceram, em seguida, outros grupos de entidades maiores que criaram as estações, segundo a posição do planeta, assim como a rotação da terra e da lua, dando origem aos mares, aos dias e às noites. Estas entidades utilizaram diversos elementos das rochas, das águas e do ar para criar os reinos animados, a partir da natureza morta. Os vegetais e os animais, seres que possuíam a capacidade de reprodução, modelaram, durante milênios, todas as suas variantes. Aos poucos, foram executando sua tarefa e eliminando uma forma de vida para construir outra mais complexa, dando origem à enorme diversidade que, atualmente, constitui estes reinos.
As divindades fizeram com que as plantas se prendessem ao solo, tornando-se fixas, e que os animais se movimentassem pelo ar, água e terra e utilizassem os vegetais como alimento. Os elementos ficaram constituídos como uma presença vital para estes reinos. Assim, a água permitiu a vida material, o ar contribuiu para o equilíbrio vegetal-animal e foi o veículo do hálito de OLOFIN; o fogo assumiu o papel de destruir e revigorar durante o processo de mudanças e OLORUN foi quem forneceu a energia vivificante.
Estas divindades ficaram a cargo do que haviam criado, se distribuindo, segundo suas características vibratórias, pelas múltiplas riquezas do planeta. Tudo isso foi testemunhado por IFÁ.
Dentro desse processo, desceram ao plano terrestre os três grandes benfeitores da Humanidade: ODUDUWA, IFÁ e OBATALÁ. O primeiro tomou parte da legião de espíritos, que se encontravam próximo, e os instruiu para a tarefa que teriam daí em diante. IFÁ modelou um corpo de muito pouca densidade, semelhante ao físico, que pertenceria a nova espécie, em fase de criação. Cada espírito, instruído por ODUDUWA, ocupou um dos corpos astrais elaborados por IFÁ; com essa morada semimaterial, começaram a vagar sobre a terra, como fantasmas.
Neste momento, OBATALÁ começou a elaborar um nova espécie , destinada a superar os outros animais. Para tanto, combinou os elementos evolutivos necessários, dando forma ao ser humano: duas pernas para sustentá-lo firmemente na posição vertical, própria de um rei; dois braços fortes para que pudesse dominar as outras espécies; um coração grande e forte dentro de um peito poderoso, capaz de proteger a força vital; uma cabeça em cima, com os melhores sentidos, para observar e perceber tudo à distância; um complexo mecanismo de nervos, músculos e fluidos, ficando, assim, consumada a obra do grande construtor do homem.
Terminada esta obra de OBATALÁ, ODUDUWA completou a criação, atribuindo um espírito com seu corpo astral a cada um daqueles reis de OBATALÁ. Estava criada a interação entre o físico e o espiritual, que os ajudou a despertar os sentidos e desenvolver o instinto. IFÁ, que ajudou a executar e testemunhou tão maravilhosa obra, transmitiu a ORUMILÁ a verdade dessas realizações, anotadas nos signos do livro sagrado, para que o conhecimento da criação humana chegasse até os dias de hoje.
Uma vez que o grupo dos espíritos ficou a cargo dos seres humanos e se iniciou a interação corpo-espírito, revelou-se a importância do periespírito criado por IFÁ, pois o espírito desprendido de OLOFIN, com sua imensa vibração, não podia manifestar-se diretamente no plano vibratório do homem animal. IFÁ já tinha resolvido esta contradição quando modelou um corpo astral com vibrações intermediárias, para ajudar na formação do novo ser.
Podemos afirmar, então, que, desde o princípio, o homem se formou com três corpos: o físico, o seu duplo astral e seu espírito, graças a vontade de OBATALÁ, de IFÁ e de ODUDUWA. Porém IFÁ, com sua sabedoria infinita e clarividência, preparou o corpo astral para diversas funções, que são explicadas em diferentes signos, de acordo com a instrução que ORUMILÁ recebeu de IFÁ. Por isso, o homem comum deve aprender os ensinamentos de ORUMILÁ para adquirir sabedoria e o ignorante não deve desprezar o que desconhece, para não aumentar sua ignorância.
Há que aprender sobre a evolução material, pois primeiro as vibrações de energia se acalmaram, tomando formas cada vez mais densas, até chegar à matéria. A quem interessar, este pode ser o ponto de partida para elevar, novamente, a vibração do pensamento e entrar em harmonia com o infinito.
Quando nasceu o duplo astral, ou periespírito, por iniciativa de IFÁ, resultado da união do corpo físico com o espírito que o domina, este teve, entre outras funções, a de permitir ao ser humano alimentar-se da energia vital de OLOFIN. Neste tempo não existia a morte, não se concebia que o criado tivesse um final, o que acontecia, também, com o periespírito. Porém, quando se estabeleceu a morte, pondo fim à vida do corpo físico, o duplo astral, com seus atributos tanto do espírito quanto do corpo material, continuou a existir, além deste último, por um tempo mais ou menos prolongado, de acordo com a influência de uma parte ou outra parte sobre ele. No homem espiritual, o periespírito morre prontamente, enquanto no homem apegado aos assuntos vulgares da vida terrena ele fica vagando pelos espaços escuros, ignorante de seu destino. Ele impede, então, que seu espírito faça a viagem a LIFÉ OORE, a morada onde descansará da missão cumprida, ainda que, mais cedo ou mais tarde, sempre fosse seguir este caminho.
Irmãos, quem tenha vidência para contemplar as formas invisíveis às pessoas comuns, aprenderá a distinguir entre o espírito de luz e as entidades malévolas. O mesmo pode acontecer com os duplos astrais que, sem objetivo determinado, vagam pelo espaço, pois não tendo os atributos físicos necessários, perderam a coerência do pensamento e, muitas vezes, servem de instrumento às entidades malévolas. Tudo isto é o que ORUMILÁ recebe por inspiração de IFÁ, ficando devidamente registrado no livro sagrado.
A irradiação espiritual se realiza enlaçando o corpo físico através de seu duplo astral. O espírito flutua toda a vida ao redor do corpo; esta é sua pequena morada, onde permanecerá um certo número de anos, lutando para lhe transmitir a mensagem do que não morre. Mas o homem comum não recebe muito dessa irradiação. Quando age de forma incorreta, uma voz que vem de dentro e que, geralmente, é chamada de voz da consciência – e que, na realidade, é o seu espírito vem lhe dar conselho. Afinal, quem melhor que a própria pessoa, elevando seu pensamento, para se aconselhar? Quem irá gostar mais de você do que você mesmo?
Por isto, homem comum, tenha a preocupação em se superar. Homem sábio, empregue sua inteligência na meditação sobre estes mistérios para que possa atingir a qualidade de santo. Continue subindo na hierarquia de IFÁ, pois as virtudes fortalecem o espírito constantemente, cobrindo o corpo com uma couraça astral, impenetrável aos maus pensamentos e a toda vibração negativa.
E se você conseguir somar às virtudes dos conhecimentos que ORUMILÁ lhe transmite, poderá conhecer a verdade muito antes da morte do corpo. Poderá compreender as experiências passadas para enfrentar o futuro com êxito. Não será torturado pelo medo e pela incerteza. Quando morrer, seu espírito, já livre de limitações, irá prestar contas diretamente ao poder do infinito.
Tudo isso é parte das lições que IFÁ, o benfeitor, ditou, milênios atrás, para os homens.