Conversando sobre Exu
Dizem que Exu é homem sério, carrasco, espírito sem compaixão alguma. Muitos falam que nem mesmo sentimento essas entidades têmMuitos temem Exu, relacionando–o com o Diabo ou com algum dessesmonstros cavernosos que a mente humana é capaz de criar.
Bem... dia desses, no campo santo de meu pai Omulu, o cemitério, vialgo inusitado, que me fez pensar...
Um desses Exus Caveiras, que apresentam essa forma plasmada comomeio de ligação à falange a que pertencem, chorava sobre um túmulo. Discretamente, isso devo dizer. Afinal, os Caveiras, em sua maioria,são de natureza recatada e introspectiva. Mas chorava sim.
Engraçado pensar nessa situação, não é mesmo? Ele chorava peloserros do passado, chorava por uma pessoa a que amava muito, mas quejá não tem mais por perto. Claro, sabe que ninguém morre, mas asaudade e o remorso apertavam fundo seu coração.
Isso acontece muito no plano espiritual, onde, muitas vezes, os laços são rompidos, devido às diferenças vibratórias. Na verdade,eles não se rompem, mas apenas se afrouxam um pouco...
Mas, voltando à nossa história, fiquei pensando muito sobre aquela visão. Pensei que ninguém acreditaria em mim, se eu contasseesse "causo" a alguém. Afinal, Exu é homem acima do bem e do mal, Exu não tem sentimento, Exu não chora...
E para aqueles, então, que endeusam "seu" Exu, pensando ser ele um grande guardião, espírito da mais alta elite espiritual, espírito corajoso, sem medos, violento guerreiro das trevas. Acaba que, na Umbanda, Exu assume um arquétipo, ou mito, tão supra–humano, que,muitas vezes, deixa de ser apenas o mais humano da própria Umbanda.
Arquétipo esse, diga–se de passagem, muito diferente do Orixá Exu, o arquétipo base para a formação do que chamamos de Linha de Esquerda dentro do ritual de Umbanda.
É, eu acho que todo Exu chora. Assim como eu e você também. Todo mundo chora, pois todos temos dores, remorsos e tristezas. Isso é humano. Mas, voltando ao campo santo...
Logo depois vi outro Exu, vestindo uma longa capa preta, aproximar-se do triste amigo Caveira. O que conversaram não sei, pois não ouvie não estava apto a ler os seus pensamentos. Mas uma coisa é certa: os dois saíram a gargalhar muito!
Engraçado... Como é que pode? Estava chorando até agora e, de repente, sai rindo, de uma hora pra outra? - pensei, contrariado.
Fiquei alguns dias refletindo sobre isso e cheguei a uma conclusão.
A principal característica de todo Exu é o seu bom–humor. Afinal,mesmo em situações muito complicadas, eles sempre têm uma boa gargalhada para dar. Na pior situação, mesmo que de forma sarcástica, eles se divertem. Eles podem escrever certo por linhas tortas, errado por linhas retas, errado por linhas tortas, ou sei lá mais o quê, mas uma coisa é certa: vão escrever gargalhando.
Admiro esse aspecto de Exu. Tem gente que, de tanto trabalhar com Exu, torna–se sério, faz "cara de mau", vive reclamando da vida, além de tornar–se um grande juiz.
A verdade é que nunca vi Exu reclamar de nada, nem julgar ninguém. Pelo contrário, o que vejo é Exu nos ensinar a não reclamar da vida, pois tem gente que passa por coisa muito pior e o faz com honra e ... bom–humor!
Vejo também que Exu não julga ninguém. Afinal, quem é ele, ou melhor, quem somos nós para julgarmos alguém? Exu ensina que o que nós muito condenamos, assim o fazemos porque isso nos incomoda. E sabe por quê? Porque tudo que condenamos aparece em nós, antes de aparecer nos outros.
Por isso Exu não gosta de falso pregador, que vive dizendo aos outros como devem agir, vive dizendo o que é certo, vive alertando os outros contra a vaidade, vive julgando, mas, no dia a dia, pouco aplica as regras que impõe para os outros. O mundo está cheio deles. E Exu sorri quando encontra um desses. Mais para frente eles serão engolidos por si mesmos. Pela própria sombra. Mas Exu não ri porque fica feliz com isso. Muito pelo contrário. Ele até sente por aquela pessoa, mas já que não dá pra fazer outra coisa, o melhor é sorrir mesmo, não é?
O certo é que a linha de Exu nos coloca frente a frente com o inimigo! Mas aqui não estamos falando de nenhum "kiumba", assediador ou obsessor, mas sim de nós mesmos. O que eu já vi de médium perdendo a compostura quando "incorporado" com Exu, não é brincadeira. Muitos colocam suas angústias para fora; outros, seus medos e inseguranças; muitos, seus complexos de inferioridade. Tudo isso Exu permite, para que a pessoa perceba o quanto é complicada e enrolada naquele sentido da vida.
Mas dizem que o pior cego é aquele que não quer ver... E o que tem de gente que não quer enxergar os próprios defeitos... Aí não resta outra opção para Exu, a não ser sorrir e sorrir mesmo quando nós nos damos mal.
Mas, ainda falando dos múltiplos aspectos contraditórios de Exu, pois ele é a contradição em pessoa, devo relatar aqui mais uma experiência surpreendente sobre a sua natureza.
Dia desses, depois de um "pesado trabalho de esquerda", fiquei refletindo sobre algumas coisas. E sempre que faço isso, algo estranho acontece.
Nesse trabalho, muitos kiumbas, espíritos assediadores, obsessores, eguns, ou seja qual for o nome que queiram dar, foram recolhidos e encaminhados pelas falanges de Exu que estavam presentes. Sabe como é... na Umbanda, a gente não pega um livro pesado e começa a doutrinar os espíritos "desregrados da seara bendita". A gente entra com a energia, com a mediunidade e com os sentimentos bacanas, deixando o encaminhamento e a "doutrinação" desses amigos mais revoltados nas mãos dos guias espirituais.
Esse trabalho foi complicado. Muitos, na expressão popular, estavam "demandando o grupo", ou seja, estavam perseguindo nosso grupo de trabalho e assistência espiritual, pois tinham objetivos e finalidades diversas e opostas.
Ninguém tinha arriado um ebó na encruzilhada contra a gente. Eram atuações vindas de inteligências opostas ao trabalho proposto e atraídas pelas "brechas vibratórias" de nossos próprios sentimentos e pensamentos.
Mas que na Umbanda ainda se pensa que tudo de errado é culpa de algum ebó na encruzilhada, isso é verdade...
Bom, o que sei é que, alguns dias depois, durante a noite, enquanto eu dormia, alguém me levou até um estranho lugar. Eu estava projetado, desdobrado, desprendido do corpo físico, ou qualquer outro nome que vocês queiram dar. Fenômeno esse muito estudado por diversas culturas espiritualistas do mundo. Fenômeno esse muito comum também dentro da Umbanda, mas pouco estudado. Afinal, muitos pensam que Umbanda é "só incorporar" os guias e, de preferência, de forma inconsciente! Sei, sei... Olha Exu gargalhando novamente!
Nesse local, muitos espíritos eram levados até mim e eu projetava energias de cura para eles. Vi várias pessoas projetadas no ambiente, inclusive gente muito próxima, do grupo. Alguns um pouco conscientes, outros completamente inconscientes. Mas o importante era a energia mais densa que vinha pelo cordão de prata e que auxiliava no tratamento daqueles irmãos sofredores.
Por quanto tempo fiquei lá não sei, já que a noção de tempo e espaço é muito diferente no plano astral. O que sei é que, em um certo momento, um Exu, que tomava conta do ambiente, veio conversar comigo:
- Está vendo quanto espírito a gente tem "pego" daquelas reuniões que vocês fazem? - perguntou ele.
- Nossa, quantos! Muito mais do que eu podia imaginar.
- E isso não é nada, comparado aos milhares que chegam, diariamente, "das muitas casas" dos guardiões da Umbanda, espalhadas pelo Brasil.
- Puxa!, mas isso é sinal que o pessoal anda trabalhando bem, não é mesmo?
- Hahahaha, mas você é um idiota mesmo, né? Desde quando fazer isso é um bom trabalho? Milhares chegam, mas sabem quantos saem daqui? Poucos! A maioria também para servir as falanges de Exu. O grande problema é que os médiuns de Umbanda pouco ou nada cuidam dos que aqui ficam precisando de ajuda.
- Nossa missão aqui é transformar os antigos valores desses espíritos, mesmo que seja através da dor. Mas, depois disso, muitos precisam ser curados, tratados. E, dessa parte, os umbandistas não querem nem saber!
- Ah, eu ainda pego o maldito que disseminou que Umbanda só serve para cortar magias negras e resolver dificuldades materiais. Vocês adoram falar de amor e caridade, mas quase ninguém se lembra de vir até aqui cuidar desses espíritos que vocês mesmos mandam para cá.
- É que muitos não sabem como fazer isso, amigo! - tentei eu defender os umbandistas.
- Claro que não sabem! Só se preocupam em "cortar demandas", combater feitiços e destruir "demônios das trevas". Grandes guerreiros! Mas nada fazem sem os vossos Exus, parecendo mais grandes bebês chorões, querendo brincar de guerra!
- Lembre–se bem. Todos que a mão esquerda derrubar terão de subir pela mão direita. Essa é a Lei. Comecem a se conscientizar de que ninguém aqui gosta de ver o sofrimento alheio. Comecem a ter uma visão mais ampla do universo espiritual e da forma como a Umbanda se relaciona com ele.
- Dediquem–se mais a esses que são encaminhados nos trabalhos espirituais. Orem por eles, façam uma vibração por eles, tratem–nos com a luz das velas e do coração. Busquem conhecimento e uma forma de auxiliá–los.
- Quero ver se amanhã, quando você não agüentar mais o chicote e não tiver ninguém para lhe estender a mão, se você vai achar tão "glamoroso" esse ciclo infernal de demandas, perseguições emagias negativas. Isso aqui é só sujeira, ódio, desgraça e tristeza. Poucos têm coragem de pousar os olhos sobre essas paragens sombrias.
- É, isso é verdade. Muitos falam, mas poucos realmente conhecem a verdadeira situação do astral inferior, à qual a Umbanda e toda a humanidade está ligada, não é mesmo?
- Hahaha, até que você não é tão idiota! Olha, vou dar um jeito de você se lembrar dessa conversa toda ao acordar. Veja se escreve isso para os seus amigos umbandistas! E pare de reclamar da vida. Quer melhorar? Trabalhe mais!
- Está certo, seu Exu Ganga. Só mais uma coisa. Um dia desses li num livro que Ganga é uma falange relacionada ao "lixo". Mas você se apresenta como um negro e, a julgar por esses facões nas suas mãos, acho que nada tem a ver com lixo...
- Lixo é esse livro que você andou lendo! Ganga é uma corruptela do termo Nganga, do tronco lingüístico bantu. Quer dizer "o mestre", aquele que domina algo. O termo foi usado por muitos, desde sacerdotes até mestres na arte da caça, da guerra, da magia, etc. Algo parecido com o Kimbanda, mas esse mais relacionado diretamenteà cura e à prática de Mbanda. A linha de Exus Ganga é formada por antigos sacerdotes e guerreiros negros. É isso! Veja se queima a porcaria do livro onde você leu essa besteira de "lixo"...
Pouca coisa lembro depois disso.
Despertei no corpo físico, era madrugada e não fui dormir mais.
Agora estou acabando de escrever esse texto, onde juntei duas experiências sobre os Exus. Não sei porque fiz isso, talvez pelo caráter desmitificador da sua figura.
Para falar a verdade, essas duas histórias são bem diferentes.
Primeiro um Exu que chora, sorri e ensina o bom–humor, o autoconhecimento e o não julgamento. Depois um Exu que se preocupacom o pessoal "lá de baixo".
Bem... dia desses, no campo santo de meu pai Omulu, o cemitério, vialgo inusitado, que me fez pensar...
Um desses Exus Caveiras, que apresentam essa forma plasmada comomeio de ligação à falange a que pertencem, chorava sobre um túmulo. Discretamente, isso devo dizer. Afinal, os Caveiras, em sua maioria,são de natureza recatada e introspectiva. Mas chorava sim.
Engraçado pensar nessa situação, não é mesmo? Ele chorava peloserros do passado, chorava por uma pessoa a que amava muito, mas quejá não tem mais por perto. Claro, sabe que ninguém morre, mas asaudade e o remorso apertavam fundo seu coração.
Isso acontece muito no plano espiritual, onde, muitas vezes, os laços são rompidos, devido às diferenças vibratórias. Na verdade,eles não se rompem, mas apenas se afrouxam um pouco...
Mas, voltando à nossa história, fiquei pensando muito sobre aquela visão. Pensei que ninguém acreditaria em mim, se eu contasseesse "causo" a alguém. Afinal, Exu é homem acima do bem e do mal, Exu não tem sentimento, Exu não chora...
E para aqueles, então, que endeusam "seu" Exu, pensando ser ele um grande guardião, espírito da mais alta elite espiritual, espírito corajoso, sem medos, violento guerreiro das trevas. Acaba que, na Umbanda, Exu assume um arquétipo, ou mito, tão supra–humano, que,muitas vezes, deixa de ser apenas o mais humano da própria Umbanda.
Arquétipo esse, diga–se de passagem, muito diferente do Orixá Exu, o arquétipo base para a formação do que chamamos de Linha de Esquerda dentro do ritual de Umbanda.
É, eu acho que todo Exu chora. Assim como eu e você também. Todo mundo chora, pois todos temos dores, remorsos e tristezas. Isso é humano. Mas, voltando ao campo santo...
Logo depois vi outro Exu, vestindo uma longa capa preta, aproximar-se do triste amigo Caveira. O que conversaram não sei, pois não ouvie não estava apto a ler os seus pensamentos. Mas uma coisa é certa: os dois saíram a gargalhar muito!
Engraçado... Como é que pode? Estava chorando até agora e, de repente, sai rindo, de uma hora pra outra? - pensei, contrariado.
Fiquei alguns dias refletindo sobre isso e cheguei a uma conclusão.
A principal característica de todo Exu é o seu bom–humor. Afinal,mesmo em situações muito complicadas, eles sempre têm uma boa gargalhada para dar. Na pior situação, mesmo que de forma sarcástica, eles se divertem. Eles podem escrever certo por linhas tortas, errado por linhas retas, errado por linhas tortas, ou sei lá mais o quê, mas uma coisa é certa: vão escrever gargalhando.
Admiro esse aspecto de Exu. Tem gente que, de tanto trabalhar com Exu, torna–se sério, faz "cara de mau", vive reclamando da vida, além de tornar–se um grande juiz.
A verdade é que nunca vi Exu reclamar de nada, nem julgar ninguém. Pelo contrário, o que vejo é Exu nos ensinar a não reclamar da vida, pois tem gente que passa por coisa muito pior e o faz com honra e ... bom–humor!
Vejo também que Exu não julga ninguém. Afinal, quem é ele, ou melhor, quem somos nós para julgarmos alguém? Exu ensina que o que nós muito condenamos, assim o fazemos porque isso nos incomoda. E sabe por quê? Porque tudo que condenamos aparece em nós, antes de aparecer nos outros.
Por isso Exu não gosta de falso pregador, que vive dizendo aos outros como devem agir, vive dizendo o que é certo, vive alertando os outros contra a vaidade, vive julgando, mas, no dia a dia, pouco aplica as regras que impõe para os outros. O mundo está cheio deles. E Exu sorri quando encontra um desses. Mais para frente eles serão engolidos por si mesmos. Pela própria sombra. Mas Exu não ri porque fica feliz com isso. Muito pelo contrário. Ele até sente por aquela pessoa, mas já que não dá pra fazer outra coisa, o melhor é sorrir mesmo, não é?
O certo é que a linha de Exu nos coloca frente a frente com o inimigo! Mas aqui não estamos falando de nenhum "kiumba", assediador ou obsessor, mas sim de nós mesmos. O que eu já vi de médium perdendo a compostura quando "incorporado" com Exu, não é brincadeira. Muitos colocam suas angústias para fora; outros, seus medos e inseguranças; muitos, seus complexos de inferioridade. Tudo isso Exu permite, para que a pessoa perceba o quanto é complicada e enrolada naquele sentido da vida.
Mas dizem que o pior cego é aquele que não quer ver... E o que tem de gente que não quer enxergar os próprios defeitos... Aí não resta outra opção para Exu, a não ser sorrir e sorrir mesmo quando nós nos damos mal.
Mas, ainda falando dos múltiplos aspectos contraditórios de Exu, pois ele é a contradição em pessoa, devo relatar aqui mais uma experiência surpreendente sobre a sua natureza.
Dia desses, depois de um "pesado trabalho de esquerda", fiquei refletindo sobre algumas coisas. E sempre que faço isso, algo estranho acontece.
Nesse trabalho, muitos kiumbas, espíritos assediadores, obsessores, eguns, ou seja qual for o nome que queiram dar, foram recolhidos e encaminhados pelas falanges de Exu que estavam presentes. Sabe como é... na Umbanda, a gente não pega um livro pesado e começa a doutrinar os espíritos "desregrados da seara bendita". A gente entra com a energia, com a mediunidade e com os sentimentos bacanas, deixando o encaminhamento e a "doutrinação" desses amigos mais revoltados nas mãos dos guias espirituais.
Esse trabalho foi complicado. Muitos, na expressão popular, estavam "demandando o grupo", ou seja, estavam perseguindo nosso grupo de trabalho e assistência espiritual, pois tinham objetivos e finalidades diversas e opostas.
Ninguém tinha arriado um ebó na encruzilhada contra a gente. Eram atuações vindas de inteligências opostas ao trabalho proposto e atraídas pelas "brechas vibratórias" de nossos próprios sentimentos e pensamentos.
Mas que na Umbanda ainda se pensa que tudo de errado é culpa de algum ebó na encruzilhada, isso é verdade...
Bom, o que sei é que, alguns dias depois, durante a noite, enquanto eu dormia, alguém me levou até um estranho lugar. Eu estava projetado, desdobrado, desprendido do corpo físico, ou qualquer outro nome que vocês queiram dar. Fenômeno esse muito estudado por diversas culturas espiritualistas do mundo. Fenômeno esse muito comum também dentro da Umbanda, mas pouco estudado. Afinal, muitos pensam que Umbanda é "só incorporar" os guias e, de preferência, de forma inconsciente! Sei, sei... Olha Exu gargalhando novamente!
Nesse local, muitos espíritos eram levados até mim e eu projetava energias de cura para eles. Vi várias pessoas projetadas no ambiente, inclusive gente muito próxima, do grupo. Alguns um pouco conscientes, outros completamente inconscientes. Mas o importante era a energia mais densa que vinha pelo cordão de prata e que auxiliava no tratamento daqueles irmãos sofredores.
Por quanto tempo fiquei lá não sei, já que a noção de tempo e espaço é muito diferente no plano astral. O que sei é que, em um certo momento, um Exu, que tomava conta do ambiente, veio conversar comigo:
- Está vendo quanto espírito a gente tem "pego" daquelas reuniões que vocês fazem? - perguntou ele.
- Nossa, quantos! Muito mais do que eu podia imaginar.
- E isso não é nada, comparado aos milhares que chegam, diariamente, "das muitas casas" dos guardiões da Umbanda, espalhadas pelo Brasil.
- Puxa!, mas isso é sinal que o pessoal anda trabalhando bem, não é mesmo?
- Hahahaha, mas você é um idiota mesmo, né? Desde quando fazer isso é um bom trabalho? Milhares chegam, mas sabem quantos saem daqui? Poucos! A maioria também para servir as falanges de Exu. O grande problema é que os médiuns de Umbanda pouco ou nada cuidam dos que aqui ficam precisando de ajuda.
- Nossa missão aqui é transformar os antigos valores desses espíritos, mesmo que seja através da dor. Mas, depois disso, muitos precisam ser curados, tratados. E, dessa parte, os umbandistas não querem nem saber!
- Ah, eu ainda pego o maldito que disseminou que Umbanda só serve para cortar magias negras e resolver dificuldades materiais. Vocês adoram falar de amor e caridade, mas quase ninguém se lembra de vir até aqui cuidar desses espíritos que vocês mesmos mandam para cá.
- É que muitos não sabem como fazer isso, amigo! - tentei eu defender os umbandistas.
- Claro que não sabem! Só se preocupam em "cortar demandas", combater feitiços e destruir "demônios das trevas". Grandes guerreiros! Mas nada fazem sem os vossos Exus, parecendo mais grandes bebês chorões, querendo brincar de guerra!
- Lembre–se bem. Todos que a mão esquerda derrubar terão de subir pela mão direita. Essa é a Lei. Comecem a se conscientizar de que ninguém aqui gosta de ver o sofrimento alheio. Comecem a ter uma visão mais ampla do universo espiritual e da forma como a Umbanda se relaciona com ele.
- Dediquem–se mais a esses que são encaminhados nos trabalhos espirituais. Orem por eles, façam uma vibração por eles, tratem–nos com a luz das velas e do coração. Busquem conhecimento e uma forma de auxiliá–los.
- Quero ver se amanhã, quando você não agüentar mais o chicote e não tiver ninguém para lhe estender a mão, se você vai achar tão "glamoroso" esse ciclo infernal de demandas, perseguições emagias negativas. Isso aqui é só sujeira, ódio, desgraça e tristeza. Poucos têm coragem de pousar os olhos sobre essas paragens sombrias.
- É, isso é verdade. Muitos falam, mas poucos realmente conhecem a verdadeira situação do astral inferior, à qual a Umbanda e toda a humanidade está ligada, não é mesmo?
- Hahaha, até que você não é tão idiota! Olha, vou dar um jeito de você se lembrar dessa conversa toda ao acordar. Veja se escreve isso para os seus amigos umbandistas! E pare de reclamar da vida. Quer melhorar? Trabalhe mais!
- Está certo, seu Exu Ganga. Só mais uma coisa. Um dia desses li num livro que Ganga é uma falange relacionada ao "lixo". Mas você se apresenta como um negro e, a julgar por esses facões nas suas mãos, acho que nada tem a ver com lixo...
- Lixo é esse livro que você andou lendo! Ganga é uma corruptela do termo Nganga, do tronco lingüístico bantu. Quer dizer "o mestre", aquele que domina algo. O termo foi usado por muitos, desde sacerdotes até mestres na arte da caça, da guerra, da magia, etc. Algo parecido com o Kimbanda, mas esse mais relacionado diretamenteà cura e à prática de Mbanda. A linha de Exus Ganga é formada por antigos sacerdotes e guerreiros negros. É isso! Veja se queima a porcaria do livro onde você leu essa besteira de "lixo"...
Pouca coisa lembro depois disso.
Despertei no corpo físico, era madrugada e não fui dormir mais.
Agora estou acabando de escrever esse texto, onde juntei duas experiências sobre os Exus. Não sei porque fiz isso, talvez pelo caráter desmitificador da sua figura.
Para falar a verdade, essas duas histórias são bem diferentes.
Primeiro um Exu que chora, sorri e ensina o bom–humor, o autoconhecimento e o não julgamento. Depois um Exu que se preocupacom o pessoal "lá de baixo".
Diferente, principalmente daquilo que estamos acostumados a ouvir dentro do meio umbandista. Talvez Exu esteja mudando. Talvez nós, médiuns e umbandistas, estejamos mudando. Talvez a Umbanda esteja mudando.
Ou, quem sabe, a Umbanda e os Exus sempre foram assim, nós é que não compreendemos direito aquilo que está muito perto de nós, mas, ao mesmo tempo, é tão diferente.
Dizem que o pior cego é aquele que não quer ver...
Ou, quem sabe, a Umbanda e os Exus sempre foram assim, nós é que não compreendemos direito aquilo que está muito perto de nós, mas, ao mesmo tempo, é tão diferente.
Dizem que o pior cego é aquele que não quer ver...
Para entrar em contato com pai Guilherme d'Bará ligue para o fone 53 84352242 ou pelo email buzionline@hotmail.com
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